12 março 2006

Elio Gaspari, Correio do Povo, 12/03/06

José Alencar, talento de ficcionista

Quando o general Francisco de Albuquerque subiu a escada do vôo da TAM que manobrou pelo pátio de Viracopos para recolhê-lo, sabia o que estava fazendo. Quando foi vaiado pelos passageiros, viu que as conseqüências vêm depois das causas.
São coisas da vida.

Mais perigoso para a segurança de um país e para a moralidade de um governo é saber-se que o ministro da Defesa, José Alencar, informou o seguinte ao presidente da República, na segunda-feira:
- Albuquerque chegou ao aeroporto 51 minutos antes da hora do embarque.
Erro. O general, acompanhado pelo sargento que foi despachar sua bagagem, chegou ao aeroporto às 17h10m, 20 minutos antes da hora prevista para a decolagem.
- Alencar disse que a bagagem do general foi etiquetada e ele recebeu um cartão de embarque.
Falso. O general só recebeu cartão de embarque depois que um casal autodefenestrou-se.
Um ministro da Defesa que dá informações dessa qualidade ao presidente é uma ameaça à segurança pública.

Recordar é viver, doutor Alencar deveria passear pela história. Cairia numa cena dos anos 60, quando Allen Dulles, monumento da elite americana e fundador da CIA, participava da investigação do assassinato do presidente John Kennedy. Um colega lhe perguntou o que ele faria se comprovasse o envolvimento dos russos no atentado. Dulles teria respondido: 'Eu seria capaz de mentir até para o Congresso. Só diria a verdade ao presidente dos Estados Unidos.'

Noutra ponta de Washington, um curioso estava numa fila de estacionamento do aeroporto. Prestou atenção num idoso, logo atrás.
Calvo, tinha óculos redondos e queixo grande. Parecia familiar. Quando caiu a ficha, o sujeito teve um surto de constrangimento.
Estava na frente do general Omar Bradley, comandante das tropas americanas que desembarcaram na Normandia e libertaram Paris. Ao fim da guerra, Bradley tinha 1,3 milhão de homens sob as suas ordens. O peso de suas vitórias alterou a rotina de um avião. No dia 14 de abril de 1981, o Air Force One, que serve ao presidente dos Estados Unidos, foi para Nova Iorque buscar seu esquife, para sepultá-lo em Washington.